Alguns mais apressados já devem estar criticando a relação entre a reforma tributária e os camelos, título desta coluna. Porém não se trata de loucura do escriba que por aqui tecla, mas sim de um dito popular segundo o qual os camelos foram montados com partes distintas de outros animais, um juntado, assim como está a nossa reforma tributária.
Que ela é uma conquista do atual governo ninguém pode duvidar. Governos anteriores bem que tentaram, mas não conseguiram tirar do papel o texto de uma reforma tributária. Porém, tudo sempre que observado atentamente tem seus poréns, o custo da aprovação foi elevado, sem contar com o enorme esforço político despendido pelo governo.
Empresários como Pedro Passos (Natura) e Luiz Carlos Trabuco Cappi (Bradesco), comemoraram a aprovação pelo Senado, outros executivos fazem questão de destacar que a reforma aprovada não é a ideal, mas é suficiente para reduzir a complexidade do sistema atual, considerado caótico.
O COSUD - Consórcio de Integração Sul e Sudeste, que reúne governadores dos estados dessas regiões, emitiram nota num tom bastante crítico ao texto que seguiu para a Câmara dos Deputados. Os governadores demonstram sua preocupação e desagrado afirmando que: “a reforma se tornou um retrocesso, com potencial de tornar o sistema tributário brasileiro ainda pior que o atual”; e nesse aspecto não estão desprovidos de razão.
Um excessivo poder dado a um Conselho Federativo que administrará a parcela de tributação que cabe a estados e municípios, o elevado número de exceções que farão com que uma série de produtos e serviços sejam menos taxados o que levaria a uma alíquota geral mais elevada, a transição para o IBS (Imposto sobre bens e serviços), uma das pernas do IVA dual, que certamente não porá fim à guerra fiscal entre estados que a princípio era apregoado como um dos objetivos de origem dessa reforma, são aspectos críticos do texto aprovado no Senado.
Outro aspecto é a desoneração dupla da cesta básica, que trata de alíquota zero nos impostos e a criação de um mecanismo de “cashback” feitas ao mesmo tempo, mas sem nenhuma transparência de como essas duas coisas funcionarão juntas.
É sempre bom lembrar que a proposta original da reforma, a PEC 45, falava em migração da tributação para o destino, o local de consumo, da não cumulatividade plena e de uma simplificação geral e a uniformidade de alíquota em todos os estados da federação, acontece que o texto ultra modificado desfigurou a proposta.
Voltando a nota do COSUD existe a observação que: “Ao tratar os iguais como diferentes e abrir exceções, com privilégios e distorções indevidas, a proposta deve agravar ainda mais a guerra fiscal entre os Estados, com potencial de causar um desastre e levar as contas públicas e a economia do país para a UTI.”
Uma das preocupações dos governadores é com a transformação do Brasil no que eles chamam de criação de ilhas de prosperidade, que poderiam afastar investimentos, aumentar desigualdades, gerar desemprego e a punição tributária dos mais pobres.
Finalizam a nota lembrando que: “O momento é de unirmos esforços, apostarmos na maturidade política em busca de um consenso para que os entes federativos não sejam punidos pelo corporativismo que cria brasileiros de primeira e segunda categoria.”
A justa preocupação dos governadores dos estados do Sul e Sudeste revela a dificuldade de compreensão por parte dos atores políticos e econômicos brasileiros por um texto de uma reforma mais que necessária, mas que não foi plenamente discutido com os que serão operadores de um regime tributário que permanece com o vício da centralização arrecadatória e sem a praticidade e a transparência tão desejada pelos brasileiros.